"Museus: reflexões e questionamentos de uma visitante" - Daniele Guimarães | Semana Nacional dos Museus 2020
Quando decidi escrever relatos de experiência em museus achei que não tinha nada a contribuir com o assunto. Fiquei me perguntando se já fui em algum museu, fiz um tour mental... Primeiro pensei o que seria um museu. Em meio à minha ignorância sobre o assunto, pensei "ah, museus são aqueles lugares famosos que guardam obras de arte caras e famosas, tipo o Museu do Louvre, lembrei da obra Monalisa... Aí resolvi fazer um histórico das minhas poucas viagens, lembrei de quando fui estagiária da Secretaria de Cultura do Estado do Amazonas - SEC/AM e, consequentemente, lembrei da Usina Chaminé, onde atuei fazendo atividade de guia para visitantes. Também veio à mente a tríade "arquivo - biblioteca - museu", visto que sou Arquivista e durante a graduação meus professores falavam bastante das diferenças e semelhanças destes. Todos preservam a memória e organizam o acesso à informação.
Resolvi pesquisar o conceito de museu...
Aí me voltei para a cidade que nasci e moro, Manaus. E surgiram várias questões.
Por que quando pensei em museus, primeiramente pensei em viagens? Por que pensei que museus são apenas aqueles lugares em que guardam e expõem obras caras e famosas? Qual foi o meu primeiro contato com o assunto ou a primeira visita em um museu? Depois das pesquisas sobre o conceito, e de relembrar as minhas viagens, me voltei bastante para Manaus. Lembrei dos lugares que visitei aqui na cidade e que remetem à arte e à cultura. Teatro Amazonas, já fui lá, e claro, pelo nome, pensei, não é museu. Já fui em centros culturais. Já fui no Palácio Rio Branco, no Palácio Rio Negro, no Palacete Provincial, na Usina Chaminé, na Galeria do Largo, no Povos da Amazônia, no Museu do Homem do Norte. Olha, já fui em museus sim.
A lista de lugares visitados foi aumentando e com isso as dúvidas em relação às nomenclaturas dos espaços culturais aqui em Manaus. Perguntei-me se a Usina Chaminé seria considerada um museu. Parti para as pesquisas. Vi que tem o nome de Centro Cultural. Palacete Provincial, também é batizado oficialmente como um centro cultural. Mas lá dentro tem o Museu da Numismática, Museu da Imagem e do Som do Amazonas (MISAM), Museu da Arqueologia e Pinacoteca do Estado. Museu dentro do Centro Cultural? Pode? É museu ou centro cultural? Que confusão! Mas é isso, nas pesquisas li que um museu faz um recorte do tempo, de assunto e memória, isso entendi bem, mas ficaram dúvidas em relação às nomenclaturas dos espaços da Secretaria de Cultura aqui de Manaus. Estariam adequados? Algum pesquisador da área pode me responder?
Mas vamos lá às minhas experiências em museus.
Decidi destacar alguns museus visitados fora da cidade de Manaus.
Numa feira de artesanato, na rua do Museu Casa de Mozart, Áustria. Fonte: Acervo pessoal, 2005. |
Em 2005 fiz uma viagem internacional, para região da Bavaria, no sul da Alemanha. E na Áustria, país vizinho, visitei o Museu Casa de Mozart. O Mozart Geburtshaus (local de nascimento de Mozart), localizado na cidade de Salzburgo, é desde 1996, um museu com a estrutura da época preservada. A casa data do século XII. Até 2007 eram expostos objetos da família Mozart, e a exposição destacava o início da vida de Mozart. No primeiro andar ficava o último piano tocado por Mozart, e também um extenso acervo documental sobre as viagens e obras do compositor. Incorporava também móveis de época e o clavicórdio (construído em 1870 e o principal centro de atenção da casa) usado por ele em vários concertos em Viena. Continha também alguns fios de cabelos e muitas de suas partituras originais de ópera. Em 2007 iniciou-se reformas na casa e em 2011 reinaugurou com nova exposição, que destaca os anos em que ele passou em Viena. Hoje o terceiro andar ocupa um espaço multimídia, uma sala intitulada Mozart Online. Equipada com computadores, através dos quais os visitantes podem acessar os manuscritos de Mozart, ouvir sua música e se informar sobre as recentes descobertas sobre a vida do compositor. Eu diria que Salzburgo toda é um museu a céu aberto.
Na lojinha do museu, no térreo do Museu Casa de Mozart. Fonte: Acervo pessoal, 2005. |
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Em 2011 visitei o Museu do Ouro (Museo del Oro) de Bogotá, na Colômbia. Fundado em 1939, o museu é considerado um dos maiores na coleção de ouro do mundo. Localizado ao norte do distrito histórico de La Candelaria, o museu conta com um acervo com mais de 55 mil peças, a maioria em ouro. A obra conhecida como Poporo Quimbaya foi a primeira da coleção, estando em exibição por 65 anos. As exposições trazem a história do povo colombiano ao longo dos séculos, e mostram a ligação e a importância da metalurgia nessas sociedades. Tem também experiências sensoriais, em que você é levado à Colômbia antiga e show de luzes e sons permite vivenciar os rituais xamânicos. Duas observações minhas sobre esse museu: primeiro, possui objetos em formatos fálicos, o que me instiga bastante. Segundo: são necessárias pelo menos duas horas de visita nesse museu. O bairro de La Candelaria, onde se localiza, eu também diria que é um museu a céu aberto.
Segue link do Museo del Oro:
Outro lugar incrível que também visitei na Colômbia, foi o Museu Arqueológico de Zipaquirá, localizado na Catedral de Sal. Esse museu remete às obras de sal, da Polônia.
No Museu Arqueológico de Zipaquirá, Colômbia. Fonte: Acervo pessoal, 2011. |
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Em 2016 fui à Ilha de Margarita, na Venezuela e visitei um museu da vida marinha, o Museu Marinho (Museo Marino) de Margarita. Concebido em 1960 por um biológo, porém foi inaugurado em 1994. O acervo é vasto, há uma grande coleção de conchas, corais, esqueletos, animais embalsamados ou empalhados, aquários com exemplares vivos da fauna marinha local, como tartarugas e tubarões. Há também salas que contam um pouco da história de Margarita, bem como um vasto acervo de utensílios ligados a vida no mar, incluindo-se réplicas de embarcações tradicionais.
Painel que mostra as figuras dos animais da profundeza do mar. Museu Marinho, Ilha de Margarita, Venezuela. Fonte: Acervo pessoal, 2016. |
Em Caracas, na Venezuela também visitei, em 2006, o Museu Bolivariano (Museo Bolivariano), dedicado a Simón Bolívar, o herói da independência latino-americana. As coleções incluem itens relacionados a Bolívar e à independência venezuelana.
E no mesmo ano visitei o Museu de Arte Contemporânea de Caracas (Museo de Arte Contemporáneo de Caracas, MACC), inaugurado em 1974, o museu possui uma das mais importantes coleções latino-americanas de arte moderna e contemporânea, com aproximadamente 4000 obras, abrangendo as principais tendências e movimentos artísticos ocidentais ao longo do século XX. O museu deu relevante apoio ao desenvolvimento do ambiente artístico na capital venezuelana.
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Voltando à atenção aos museus de Manaus, e em meio ao meu amadorismo quanto ao assunto, seguem os questionamentos:
1.Por que as ações educativas voltadas para a participação comunitária, para ampliar o acesso da sociedade, citadas no artigo 29 da Lei nº 11.904/09 (Lei que Institui o Estatuto de Museus) não são realizadas de forma massiva?
2.As ideias de "museu aberto" e de "museu reflexivo" não cabe aos museus de Manaus?
3.Falta sensibilidade para ampliar horizontes e, em vez de ficar no objeto, voltar-se ao indivíduo?
4.E o Museu Amazônico, museu público que faz parte da Universidade Federal do Amazonas, por toda a riqueza do seu acervo e, por ser um museu pertencente à uma instituição de ensino, não poderia protagonizar um papel mais ativo na sociedade, principalmente voltado à comunidade acadêmica? O que falta para uma maior visibilidade (principalmente dentro da Universidade) do Museu Amazônico?
5.Os museus não poderiam ter papel mais voltado ao desenvolvimento da educação na sociedade?
6.Por que os museus de Manaus não aparecem para a sociedade enquanto agentes sociais e políticos, como de fato devem ser?
7.Por que o assunto museu é tão restrito?
Museu remete à história, ao passado que faz entender o presente, e sem uma boa reflexão do ontem não saberemos lidar bem com o amanhã.
Daniele Guimarães
Arquivista e Cientista Social
Servidora Pública/UFAM
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"Socióloga de Botequim".
PS: Devido ao problema técnico no meu notebook, não consegui inserir mais fotos das visitas aos museus. Assim que estiver resolvido o problema, solicitarei edição a essa publicação para inclusão de mais fotos.
Os cidadãos amazonenses estão ocupando virtualmente o Blog Museus do Amazonas, na Semana Nacional dos Museus 2020, devido à pandemia Covid-19.
Excelente reflexão, minha querida Dani. Os seus questionamentos são pertinentes. A diversidade de nomenclaturas expõe por um lado a fragilidade do Estado em prover o reconhecimento e fortalecimento das instituições como museus e, por outro, da própria dificuldade de entender o museu como um lugar híbrido, pulsante, que não congrega somente coleções e especialistas mas, antes de tudo, deve servir à sociedade em toda sua pujança e vitalidade sociocultural. Parabéns, você é uma ativa frequentadora de museus e suas observações e questionamentos são muito válidos e necessários. Abraços, com saudades. Saulo
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